
Célio Novaes da Silva
Hélio Consolaro
Nunca soube que tivesse viajado. Sabia francês sem ter conhecido Paris. Suas raízes estavam fincadas em Araçatuba. Seu lazer noturno era a praça Rui Barbosa. Na minha adolescência, encontrei o Célio fazendo footing, casei-me, tive filhos e neto, e o amigo continuava nos bancos da mesma praça.
Morou por muito tempo na esquina das ruas Tabajara e Silva Jardim, local que se transformou em ponto comercial. Assim, ele foi empurrado para a periferia, na rua Luís Vignoli, no Jardim Casa Nova. Era o lugar que lhe coube na cidade.
Não sei se o mundo não mudava para ele. Talvez assumira exageradamente a sua negritude, ensimesmou-se, nunca soube que tivesse uma namorada de andar de mãos dadas, mas curtia suas musas, aquelas inatingíveis. Era um romântico.
A música moldou o seu corpo, por isso o seu pescoço tinha uma leve inclinação para a esquerda de tanto apoiar o violino. O seu palco não vivia cercado de fãs descabeladas, mas de gente que entendia de música. Era um astro tribal.
Fiz-lhe uma crônica há algum tempo. Toda vez que encontrávamos, ele me lembrava dela. Achou muito engraçado por eu tê-lo chamado de “estátua viva da Praça Rui Barbosa”.
Seu pai, o maestro Pedro Novaes, regera a Banda Municipal de Araçatuba e foi homenageado com nome de rua. Apesar de sua alma de artista, herdada, viveu de sua timidez. Fazia convidados de uma cerimônia nupcial se emocionar com os gemidos de seu violino. O seu instrumento musical era uma ferramenta, ele, apenas um trabalhador.
Ao chegar à Secretaria da Cultura, encontrei o Célio como maestro da Orquestra de Cordas, que reunia músicos experientes e jovens egressos do Projeto Guri. O violino ensurdecera por causa de seu estado debilitado. Então, como João Carlos Martins, passou à regência.
Pensei: “Agora vou ajudar meu amigo”, mas nem tudo acontece como se quer. No poder público, a burocracia é trabalhosa e exigente. Projeto, CNPJ, diretoria da orquestra e ainda, para complicar mais, alguns desentendimentos entre seus componentes. Assim, eu não soube ser seu amigo, e ele não quis aproveitar a oportunidade de ter um amigo secretário. Construímos um monólogo.
A estátua tombou em pleno carnaval. Mais uma estrela no céu. Que tal reerguê-la na mesma praça, como músico de Araçatuba, mas também como o araçatubense que mais horas viveu em seus bancos.
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